No começo dos tempos,
o poderoso Gilgamesh reinava em Uruk. Gilgamesh não era uma pessoa comum. Era filho de uma deusa
e isso o tornava parte deus e parte homem. Tinha uma beleza perfeita, muita coragem e sabedoria. Foi ele quem construiu a
cidade de Uruk e mandou erguer seus palácios, templos, portas e muralhas.
Mas Gilgamesh era muito orgulhoso
e prepotente. Exercia seu poder sem admitir oposição nem intromissão. Mandava e desmandava em seus súditos e exigia que suas
ordens e desejos fossem cumpridos. Tinha todas as mulheres que queria e não respeitava nem seus próprios parentes. Dizia a
todos que não existia ninguém na face da Terra capaz de enfrentá-lo.
Seus súditos rogaram
à deusa Aruru, senhora da criação e da fecundidade, para que abrandasse o coração de Gilgamesh. A bondosa deusa atendeu ao
pedido e resolveu criar um homem tão forte quanto o rei de Uruk. Com a argila do leito, ela moldou uma criatura e lhe deu
vida, assoprando e suas narinas. Criou, assim, Enkidu, um homem selvagem.
Enkidu tinha o corpo
coberto de pêlos, como um animal, e cabeleira longa e despenteada. Seus gestos eram embrutecidos e sua fala era grosseira.
Comia ervas e larvas, usava pedras e madeira tosca para atacar e se defender. Tinha uma força descomunnal e ignorava a vida
civilizada. Vivia entre os animais e atacava ¬os homens como uma fera, despedaçando-os com seus dentes e ¬unhas.
Logo Gilgamesh ficou
sabendo desse homem selvagem. Percebeu que seria arriscado enfrentar um ser tão primitivo e des¬controlado. Resolveu, então,
utilizar de astúcia para captura-lo. Mandou uma jovem e bela mulher esperá-lo no riacho onde ele ia beber. Quando Enkidu a
viu, ela se despiu e o seduziu com seus encantos.
Enkidu ficou fascinado
com a jovem. Durante dias permaneceu ao seu lado, manso e submisso como um cordeiro. Deixou que ela lhe cortasse o cabelo
e lhe raspasse os pêlos. A jovem lhe ensinou a viver entre os homens e lhe mostrou a civilização. Deu-lhe pão e vinho, vestiu-o
e o fez sentar à mesa; ensinou-lhe a tocar harpa e a cantar. Depois o levou a Gilgamesh. Ao ver a cidade, Enkidu ficou impressionado
com suas muralhas e templos.
Frente a frente, Gilgamesh
e Enkidu exibiram sua força como touros e acabaram lutando de forma feroz. Lutaram durante horas no alto das muralhas. Tinham
a mesma força e nenhum conseguia derrubar o outro. De repente, Gilgamesh tropeçou numa pedra solta e se desequilibrou, caindo
para fora da muralha. Com muita sorte, segurou-se no beiral e tentava subir quando Enkidu debruçou-se sobre a muralha. Para
sua surpresa, o selvagem inimigo estendeu-lhe a mão e o puxou para o alto. Deste gesto nasceu uma grande amizade. Gilgamesh,
o rei civilizado, compreendeu finalmente o que era ser humano. E Enkidu, o homem selvagem, civilizou-se.